Mostrar mensagens com a etiqueta Musicæ Sacræ Disciplina. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Musicæ Sacræ Disciplina. Mostrar todas as mensagens

segunda-feira, 29 de abril de 2024

Sessantini: a expressão “ceteris paribus” em Sacrossanctum Concilium 116

Continuamos a tradução e republicação
dos esplêndidos artigos contidos no 

Boletim informativo do centro de Canto Gregoriano «Dom Jean Claire» - Verona
Ano II - n° 2 - Maio - Agosto 2020

  

Gilberto Sessantini

O significado da expressão “ceteris paribus”

AAS: Acta Apostolicae Sedis
IMSSL: Instr. De Música Sacra et Sacra Liturgia, 1958
MD: Mediador Dei, 1947
MS: Musicam Sacram, 1967
MSD: Música Sacrae Disciplina, 1955
SC: Sacrosanctum Concilium, 1963

Depois de nos termos debruçado num precedente artigo [1] sobre o estatuto do “canto próprio da liturgia romana” aplicado ao canto gregoriano pelo n° 116 da Sacrosanctum Concilium, queremos dedicar algumas linhas à expressão “ceteris paribus” ̶ normalmente traduzida como “ em igualdade de condições" ̶ presente no mesmo número da constituição conciliar e, em sua maioria, interpretada em sentido restritivo, ou seja, limitando o uso do canto gregoriano. Em primeiro lugar, revisemos integralmente o texto em questão, porque, como é óbvio e oportuno, a primeira operação a fazer quando se fala de um inciso é colocá-lo no seu justo contexto:

Ecclesia cantum gregorianum agnoscit ut liturgiae romanae proprium: qui ideo in actionibus liturgicis, ceteris paribus, principem locum obtineat. Alia genera Musicae sacrae, praesertim vero polyphonia, in celebrandis divinis Officiis minime excluduntur, dummodo spiritui actionis liturgicae respondeant, ad normam art. 30.” [2]

[1] G. SESSANTINI, Il gregoriano e il suo statuto di “canto proprio della liturgia romana, in Vox gregoriana, Bollettino informativo del centro di Canto Gregoriano e monodie "dom Jean Claire" Verona, anno I, n° 2 Maggio-Agosto 2019.

[2] SC 116.

A afirmação principal, que assim fundamenta todo o número 116, é que a Igreja reconhece o canto gregoriano como o canto próprio da liturgia romana. Desta afirmação de princípio derivam duas consequências práticas. A primeira é que nas celebrações deve reservar-se-lhe o lugar principal. A segunda, todavia, é que não devem ser excluídos, de modo algum, outros géneros de música sacra por causa desta primazia do canto gregoriano. Encontramo-nos perante um princípio claro e duas consequências práticas que dele decorrem e que são igualmente claras. Qual é, então, o significado de um aparte como aquele inserido na primeira consequência prática derivada do princípio básico afirmado precedentemente?

Para compreendê-lo, devemos antes de mais reconstruir a génese da referida passagem e, de forma mais geral, das declarações de princípio relativas ao canto gregoriano.

Como muitas outras declarações da Sacrosanctum Concilium, também aquela em questão é devedora do Magistério precedente, contrariamente ao que se crê. No que diz respeito à liturgia, à música sacra em geral e ao canto gregoriano em particular - para além das afirmações de princípio presentes nos documentos da primeira metade do século XX, cujo fundador foi o Motu proprio Inter sollicitudines [3] de Pio X -, é sobretudo o riquíssimo magistério de Pio XII a fazer escola, com uma primeira Encíclica, a Mediador Dei de 1947, estabelecendo todo o seu pensamento sobre a liturgia; uma segunda Encíclica, a Musicae Sacrae Disciplina de 1955, inteiramente dedicada à música sacra [4]; e finalmente uma Instructio de Musica Sacra et Sacra Liturgia, da Sagrada Congregação dos Ritos de 1958 [5], que pode considerar-se verdadeiramente como “o testamento espiritual de Pio XII em matéria litúrgica” [6]. É precisamente neste último documento que aparece pela primeira vez nos documentos magisteriais a expressão “ceteris paribus”:

Cantus gregorianus est cantus sacer, Ecclesiae romanae proprius et principalis; ideoque in omnibus actionibus liturgicis non solum adhiberi potest, sed, ceteris paribus, aliis Musicae sacrae generibus est praeferendus”. (IMSSL 16) [7]

[3] Ver também a Carta ao Card. Respighi: Acta Pii X, vol. I, pp. 68-74; v. p. 73s; Acta Apostolicae Sedis (AAS) 36 (1903-04), pp. 325-329, 395-398, v. 398. Também Pio XI disto se ocupa: ver PIUS XI, Const. apost. Divini cultus: AAS 21(1929), p. 33s.

[4] Em AAS 48(1956), pp. 5-25. Eis as expressões altamente elogiativas reservadas ao gregoriano: “A essa santidade se presta sobretudo o canto gregoriano, que desde tantos séculos se usa na Igreja, a ponto de se poder dizê-lo património seu. Pela íntima aderência das melodias às palavras do texto sagrado, esse canto não só quadra a este plenamente, mas parece quase interpretar-lhe a força e a eficácia, instilando doçura na alma de quem o escuta; e isso por meios musicais simples e fáceis, mas permeados de tão sublime e santa arte, que em todos suscitam sentimentos de sincera admiração, e se tornam para os próprios entendedores e mestres de música sacra uma fonte inexaurível de novas melodias. Conservar cuidadosamente esse precioso tesouro do canto gregoriano e fazer o povo amplamente participante dele, compete a todos aqueles a quem Jesus Cristo confiou a guarda e a dispensação das riquezas da Igreja. Por isso, aquilo que os Nossos predecessores são Pio X, com toda a razão chamado restaurador do canto gregoriano, e Pio XI, sabiamente ordenaram e inculcaram, também nós queremos e prescrevemos que se faça, prestando-se atenção às características que são próprias do genuíno canto gregoriano; isto é, que na celebração dos ritos litúrgicos se faça largo uso desse canto, e se providencie com todo o cuidado para que ele seja executado com exactidão, dignidade e piedade”.

[5] In AAS 50 (1958), pp. 630-663.

[6] F. ANTONELLI, L’Istruzione della Sacra Congregazione dei Riti sulla Musica Sacra e la Sacra Liturgia, Opera della Regalità, Milano 1958, p.5.

[7] Instr. De Musica Sacra et Sacra Liturgia, (IMSSL) n° 16. Texto em F. ANTONELLI, op. cit. Em italiano, na tradução oficial: “Il canto gregoriano è il canto sacro proprio e principale della Chiesa romana. Perciò in tutte le azioni liturgiche, non solo si può usare, ma anche, a parità di condizioni, è da preferirsi agli altri generi di Musica sacra”.
N. do T.: Em português, na Instrução sôbre a Música Sacra e a Sagrada Liturgia. 1958. Editôra Vozes Ltda., Petrópolis, R. J., Rio de Janeiro, São Paulo, Belo Horizonte: «16. Canto gregoriano é o canto sacro principal e próprio da Igreja romana. Portanto, não só pode ser usado em todos os atos litúrgicos, mas, em igualdade de condições, deve ser preferido aos outros gêneros de Música sacra».

O contexto no qual este parágrafo dedicado ao canto gregoriano se insere é o “Capítulo II: Normas gerais". Sobre o gregoriano já se havia dito algo, mas num sentido mais genérico, no parágrafo n.º 5 do “Capítulo I: Noções gerais”. As “Normas gerais” do segundo capítulo da Instrução preocupam-se em traçar a execução das acções litúrgicas “conforme os livros litúrgicos devidamente aprovados pela Sé Apostólica” [8], especificando que “a língua dos atos litúrgicos é o latim” [9] e que, portanto, “nas Missas cantadas, ùnicamente a língua latina deverá ser usada” [10], assim como nas missas rezadas, à excepção de “algumas orações ou cantos populares” [11] que podem ser feitos em vernáculo, e ainda “o Evangelho e também a Epístola sejam lidos em vernáculo por algum leitor, para proveito dos fiéis” [12]. O n.º 16 prossegue com a exposição do princípio supracitado do qual derivam as seguintes consequências:

Por conseguinte: a) A língua do canto gregoriano, como canto litúrgico, é ùnicamente o latim. b) As partes dos atos litúrgicos que, conforme as rubricas, são cantadas pelo sacerdote celebrante e por seus ministros, o devem ser ùnicamente no canto gregoriano constante das edições típicas (...). c) Onde, por  Indultos particulares, fôr permitido que nas Missas cantadas o sacerdote celebrante, o diácono ou o subdiácono ou o leitor, depois de cantados em gregoriano os textos da Epístola ou da Lição e o Evangelho, possam proclamar os mesmos textos também na língua vernácula, deve isso ser feito por meio de uma leitura em voz alta e distinta, com exclusão de qualquer melodia gregoriana, autêntica ou imitada”. [13]

[8] IMSSL 12.

[9] IMSSL 13.

[10] IMSSL 14a.

[11] IMSSL 14b.

[12] IMSSL 14c.

[13] IMSSL 16.

É claro que o contexto legislativo de IMSSL 16 diz respeito à vontade explícita de reiterar a necessária fidelidade rubrical em relação à língua latina e o seu natural e exclusivo revestimento musical litúrgico que é precisamente o canto gregoriano tal como se encontra nos vários livros litúrgicos, desde o Missal ao Gradual e assim por diante. Tanto é assim que nos números seguintes aparecem indicadas as modalidades de uma possível inclusão da “Polifonia sacra” [14] (e é aqui que aparecem as condições às quais voltaremos), da “Música Sacra moderna” [15], a exclusão do “canto popular religioso” [15], salvo disposição em contrário por Indulto [16], e a exclusão de modo total da que está definida como Música religiosa” [17]. E isto se baseia no princípio, reiterado ulteriormente também no termo do segundo capítulo, de que “[t]udo quanto, conforme os livros litúrgicos, deve ser cantado (...) pertence integralmente à Sagrada Liturgia” [18].

[14] IMSSL 17.

[15] IMSSL 18.

[16] IMSSL 19.

[17] IMSSL 20.

[18] IMSSL 21.

Se este é o contexto para inserir o ditame de IMSSL 16, é inequívoco que este número seja o inspirador da posterior indicação conciliar. Mas com uma diferença que é bom não transcurar. No caso da Instrução de 1958, de facto, a referência a outros géneros de música sacra aos quais se deve preferir o canto gregoriano está presente na mesma frase. Em SC 116, porém, o inciso “ceteris paribus” é absoluto, não associado imediatamente aos outros géneros dos quais se pretende ser condição limitante. O significado que a expressão “ceteris paribus” assume na Instrução de 1958 é, portanto, o seguinte: o canto gregoriano deve, em qualquer caso, ser preferido aos outros géneros de música sacra, mesmo quando estes correspondam a todas as características exigidas a um verdadeiro canto litúrgico. Na verdade, neste caso "ceteris paribus"  ̶ que à letra se traduz como "a par dos outros" ̶ tem mais claramente o significado de "posto em confrontação com os outros (géneros)", ou ainda "estando assim as coisas" [18b] e "em paridade de circunstâncias", e portanto a tradução mais eficaz e clara resulta ser esta:

O canto gregoriano é canto sacro [por excelência], próprio e principal da Igreja romana; portanto, em todas as acções litúrgicas não só se pode utilizar, como, em paridade de circunstâncias, é de preferir-se aos outros géneros de Música sacra”.

O inciso "ceteris paribus" é, pois, um reforçante do uso ("não só se pode utilizar") e do uso preferencial ("como é de preferir-se") do gregoriano em comparação com os outros géneros de música sacra, mesmo quando estes superam as barreiras de admissibilidade, em coerência com toda a implantação de IMSSL, que, derivando das normativas precedentes, visa reintroduzir o canto gregoriano em todos os níveis de celebração, incluindo a nível popular com a participação dos fiéis no canto do liturgia segundo os diferentes graus individuados. É neste documento, de facto, que são propostos pela primeira vez os chamados “graus de participação” [19], que encontraremos mais tarde na Instrução Musicam Sacram de 1967 [20].

[18b] N. do T.: do latim jurídico rebus sic stantibus.

[19] IMSSL 24 e 25.

[20] MS 7 e 29,30,31.

Em SC 116, porém, o termo de comparação desaparece, uma vez que os “outros géneros de música sacra” são enunciados só no parágrafo seguinte e “ceteris paribus” se encontra, portanto, semântica e logicamente isolado. Além disso, a tradução oficial italiana insere uma nuance da conotação jurídica, no momento em que as “circunstâncias” se tornam “condições”, assimilando neste modo a frase às cláusulas contratuais com as quais geralmente se estabelece a igualdade sob certas condições. Ao fazê-lo, é o uso do gregoriano que resultaria estar sujeito a condições e não, vice-versa, a utilização dos outros géneros de música sacra, como claramente aparecia no documento de 1958. As traduções alemã de “ceteris paribus” como “Voraussetzungen” (pré-requisitos) e espanhola “circunstancias” (circunstâncias) avizinham-se mais do significado original, ao passo que o inglês “things” (coisas) e o francês “choses” (coisas) permanecem mais genéricas [21]. [21b]

[21] As traduções nas principais línguas ocidentais foram retiradas do sítio oficial do Vaticano:
“L’Église reconnaît dans le chant grégorien le chant propre de la liturgie romaine; c’est donc lui qui, dans les actions liturgiques, toutes choses égales d’ailleurs, doit occuper la première place”.
“The Church acknowledges Gregorian chant as specially suited to the Roman liturgy: therefore, other things being equal, it should be given pride of place in liturgical services.”
“La Iglesia reconoce el canto gregoriano como el propio de la liturgia romana; en igualdad de circunstancias, por tanto, hay que darle el primer lugar en las acciones litúrgicas.”
“Die Kirche betrachtet den Gregorianischen Choral als den der römischen Liturgie eigenen Gesang; demgemäß soll er in ihren liturgischen Handlungen, wenn im übrigen die gleichen Voraussetzungen gegeben sind, den ersten Platz einnehmen.”

[21b] N. do T.: Tradução oficial em língua portuguesa: "A Igreja reconhece como canto próprio da liturgia romana o canto gregoriano; terá este, por isso, na acção litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o primeiro lugar."

Mas será esta realmente a interpretação a ser dada ao inciso “ceteris paribus” em SC 116, ou seja, uma limitação ao uso preferencial do canto gregoriano? Não creio. Em primeiro lugar, justamente pela origem desta expressão, como demonstrado. Em segundo lugar, porque se perderia a lógica de todo o quadro de SC116.
De que “condições” se fala, então, e a que se referem elas?
De “condições” dissemos que se fala na IMSSL. E são estas as condições de admissibilidade da “Polifonia Sacra” e da “Música Sacra moderna” na liturgia:

“A Polifonia sacra pode ser usada em todas os atos litúrgicos, sob a condição de haver uma schola que a execute conforme as regras da arte. Êste gênero de Música Sacra convém mais aos atos litúrgicos cuja celebração se reveste de maior esplendor.” (IMSSL 17) 
“A Música Sacra moderna pode também ser admitida em todos os atos litúrgicos, se corresponder realmente à dignidade, à gravidade e santidade da Liturgia e houver uma schola que a possa executar conforme as regras da arte.” (IMSSL 18)

As condições, portanto, seriam ainda aquelas individuadas pela normativa eclesiástica desde Pio X: santidade, bondade de formas e universalidade, para além das possibilidades técnico-artísticas dos intérpretes. Estas determinam a possibilidade ou não de inserção no projeto litúrgico-musical de outros repertórios além do canto gregoriano, que por sua natureza satisfaz plenamente essas condições, servindo também e até - justamente por isto - de modelo. [22]

[22] MSD 21-22.

Os textos escritos como comentário ao IMSSL não entram na argumentação, limitando-se a citar ou parafrasear os ditames da Instrução. Por exemplo, Gelineau comenta assim: “nas acções litúrgicas, [o canto gregoriano] deve ser preferido – suposta a paridade de condição – aos outros géneros de música sacra” [23]. Aqui as condições tornam-se “condição”, mas é claro que não é o gregoriano a ser condicionado, mas sim os outros géneros de música sacra, segundo o pensamento da IMSSL.

[23] J. GELINEAU, Canto e musica nel culto cristiano, LCD Torino 1963, p 327. A edição original francesa é de 1959.

Os comentadores de SC e MS, porém, interpretam o inciso “ceteris paribus” de SC 116 de variados modos, segundo a ideologia inspiradora. Os mais oficiais vão no sentido de um alargamento dos critérios que SC coloca para a admissão de outros géneros de música sacra, como faz, por exemplo, Bugnini, que, logo após haver afirmado que “o gregoriano continua a ser o canto próprio do Igreja e, portanto, ceteris paribus (sic), a ser preferido por direito nativo", assim interpreta e conclui: "note-se o inciso ceteris paribus, que estabelece o equilíbrio entre os vários géneros musicais" [24], quase contornando aquele outro tanto significativo "direito nativo” que ele mesmo atribuiu ao canto gregoriano. Num sentido restritivo do canto gregoriano, por sua vez, vão os comentadores que pertencem à área Universa Laus, lendo nas “condições exigidas” antes de mais a destinação exclusivamente assemblear que deve ter o canto litúrgico, destinação, segundo eles, dificilmente aplicável ao gregoriano e, por isso mesmo, decretando a completa marginalização se não o completo ostracismo do "canto próprio" da liturgia da própria liturgia. Por outro lado, os comentaristas pertencentes à área ceciliana não entram no tema, excepto para meter à luz a ambiguidade originário do inciso, ou para condenar a interpretação unilateral, ou para depreciar a perigosidade das consequências práticas das suas interpretações unilaterais. [25]

[24] A. BUGNINI, La musica sacra, in F. ANTONELLI- R. FALSINI (cur.), Costituzione Conciliare sulla Sacra Liturgia. Introduzione, testo latino-italiano, commento, Opera della Regalità, Roma 1964, p. 323. Mais adiante, consciente de que “se todos os géneros musicais têm doravante direito de cidadania no culto, o seu uso é regulado pelo quê?”, o principal fautor da reforma litúrgica assim conclui e responde: “Na minha opinião pelos seguintes elementos: a) pelas normas positivas da Constituição ou da legislação musical, emitidas e não superadas; b) por normas positivas dadas ou a serem dadas pela autoridade eclesiástica competente, referida no art. 22; c) pelo bom gosto e pelo bom senso” (ibidem, p. 324). Nos anos sucessivos, no que diz respeito à regulamentação dada, bom gosto e bom senso raramente foram aplicados.

[25] Uma revisão em V. DONELLA, Editoriale, in "Bollettino Ceciliano", Anno 104, N. 3, Março 2009.

Não devemos ignorar, porém, que uma pequena complicação provém ainda da Instrução Musicam Sacram de 1967, a qual no nº 50 assim se exprime: “Nas ações litúrgicas em canto, celebradas em língua latina, ao canto gregoriano, como canto próprio da liturgia romana, se reserve, a paridade de condições, o posto principal”. O aditamento "celebrado em língua latina" parece querer ulteriormente restringir o âmbito do ditame conciliar às celebrações apenas em língua latina, tendo presente que em Itália a CEI tornou, de facto, impossíveis as celebrações em língua latina quando se está na presença de fiéis, contradizendo com esta limitação até o que foi disposto pelo próprio concílio [26]. Todavia, mesmo neste documento, que nas intenções originais deveria ter respondido aos quesitos e às dificuldades entretanto surgidas, e deveria ter resolvido as dúvidas práticas sobre a aplicação da reforma litúrgica e da música sacra [27], o inciso “a paridade de condições” não chega a ser adequadamente considerado nem explicado, contribuindo deste modo para deixar a questão numa espécie de limbo linguístico e canónico.

[26] Cfr CEI, Precisazioni, n° 12. Messale Romano ed. 1983: “Nas Missas celebradas com o povo usa-se a língua italiana (...). Os Ordinários do local (...) podem estabelecer que em algumas igrejas frequentadas por fiéis de diversas nacionalidades se possa usar ou a língua própria dos presentes ou a língua latina (...). Noutros casos previstos com base numa verdadeira motivação peneirada pelo Ordinário do local, deve-se em todo o caso usar a edição típica do Missale Romanum”. Note-se o uso do indicativo “usa-se” com sabor absolutizante e exclusivo, ao invés de um “use-se”, conjuntivo de género exortativo e inclusivo.

[27] Cfr MS 2 e 3.

Do quanto dissemos e demonstrámos, parece-me poder concluir que na legislação eclesiástica a expressão “ceteris paribus”, longe de ser restritiva em relação ao gregoriano, mete ainda mais em evidência as suas preeminência e exemplaridade. Trata-se de um inciso que, mutuado de um documento precedente, mudou em parte de significado mudando de contexto e, assim fazendo, ofereceu o flanco a interpretações diversas. Todavia, sob pena de negar todo o magistério anterior, a única interpretação possível resulta ser a original, presente na Instrução pacelliana. E as condições selectivas que o inciso “ceteris paribus” pressupõe serão (re)encontradas naquelas tradicionais (santidade, bondade de formas, universalidade) que deveriam ser verificadas em cada repertório ou género musical que se queira incluir na liturgia cantada. Por outro lado, tal inciso deve ler-se sòmente no constante Magistério da Igreja e não na interpretação de indivíduos singulares, musicólogos ou liturgistas que sejam. A vontade da Igreja é extremamente clara e refere-se ao gregoriano, não só como ao seu “canto próprio”, mais ainda como oração viva para uma liturgia viva e lhe exige a sua presença não como património histórico ou historicizado, nem como peça de museu para mostrar em ocasiões particulares, mas como canto que orienta para Deus todo o “fazer” da liturgia, fazendo-lhe emergir o seu “ser”.

segunda-feira, 25 de março de 2024

Sessantini: o nº 116 da Sacrosanctum Concilium do Concílio Vaticano II ou o que significa o canto gregoriano ser próprio da liturgia romana


Continuamos a tradução e republicação dos magníficos artigos contidos no 

Boletim informativo do centro de Canto Gregoriano «Dom Jean Claire» - Verona
n° 2 - Maio - Agosto 2019

 

Gilberto Sessantini

O gregoriano e o seu estatuto de
"canto próprio da liturgia romana".

Entre as diversas definições que tentam determinar, cada uma segundo diversas perspectivas [1], o que seja o canto gregoriano, a mais inerente à teologia litúrgica, e por consequência a que mais deve interessar a todos os amantes das duas disciplinas envolvidas [2], é a seguinte: o canto gregoriano é “o canto próprio da liturgia romana” [3]. Esta definição é explicitada no n.º 116 da Sacrosanctum Concilium, a constituição do Vaticano II sobre a liturgia. Este número diz assim:

Ecclesia cantum gregorianum agnoscit ut liturgiae romanae proprium: qui ideo in actionibus liturgicis, ceteris paribus, principem locum obtineat.
Alia genera Musicae sacrae, praesertim vero polyphonia, in celebrandis divinis Officiis minime excluduntur, dummodo spiritui actionis liturgicae respondeant, ad normam art. 30.
O facto de que seja um documento conciliar a afirmar uma realidade tão significativa deveria, por si só, não deixar margem para dúvidas quanto à precípua relevância que o canto gregoriano deverá assumir na liturgia da Igreja, nem de que deva manter um "locum principem". Todavia, sabemos que as interpretações práticas e “pastorais” das normativas conciliares determinaram, de facto, o desaparecimento do gregoriano das celebrações, tanto que se tornou “um estranho na sua própria casa” [4]. Uma análise deste número do documento conciliar permite-nos formular algumas reflexões que podem contribuir para clarificar o alcance do ditame e a vontade dos Padres conciliares sobre o conceito de "cantum proprium", reservando-nos o direito de num próximo artigo debruçarmo-nos sobre a expressão “ceteris paribus”, imediatamente sucessiva e normalmente interpretada como o que tornou possível a negação da primeira afirmação, graças à sua pressuposta vaga ambiguidade.

[1] Para uma definição histórico-musical do canto gregoriano poderemos dizer que, num sentido geral, sob o termo canto gregoriano se coloca um enorme corpus de peças monódicas, compostas ao longo dos séculos e distribuídas em vários livros litúrgicos. Em sentido estrito, porém, o gregoriano é aquele canto que surge da fusão do canto romano antigo com as instâncias musicais próprias do mundo franco-germânico, fusão que ocorreu no século VIII e respondeu a lógicas unificadoras, a liturgia e o canto, mas também a cultura e a política. Para dar “peso político” e autoridade a esta operação litúrgico-musical, atribuiu-se a a Gregório Magno, Papa de 590 a 604, a inspiração divina das composições presentes nos Antifonários e Graduais, como recorda o poema litúrgico Gregorio Presul, posteriormente feito tropo do Intróito do Primeiro Domingo do Advento, presente nos Graduais da região franca do século IX: daí o nome de canto gregoriano.

[2] Ou seja, teologia litúrgica e estudos gregorianos. Dificilmente os dois âmbitos de pesquisa têm seguido até aqui um caminho comum, uma ocupando-se apenas dos aspectos musicais histórico-interpretativos, a outra considerando o canto gregoriano apenas como um dos tantos repertórios possíveis com os quais cantar a liturgia. Este meu contributo pretende ser uma tentativa de superar esta falta de diálogo. Era diferente, na verdade, a sinergia que caracterizava até ao Concílio Vaticano II as pesquisas semiológica e de âmbitos histórico-litúrgicos, que andavam de par e passo.

[3] A definição de “canto próprio” aplicada ao gregoriano é utilizada pela primeira vez nos documentos do Magistério por São Pio X no Motu proprio Tra le sollecitudini de 1903. Neste documento, o gregoriano é denominado “canto próprio da Igreja romana”.  Pode encontrar-se um extenso exame da legislação canónica relativa ao canto gregoriano no precioso volume de GIANNICOLA D'AMICO, Il canto gregoriano nel Magistero della Chiesa, Conservatorio di Rovigo, 2009.

[4] FULVIO RAMPI, Il canto gregoriano: un estraneo in casa sua, discurso proferido em 19 de maio de 2012 em Lecce no primeiro encontro: “Colloqui sulla musica sacra. Cinquant'anni dal Concilio Vaticano II alla luce del magistero di Benedetto XVI”.

Em primeiro lugar, convém partir do sujeito que rege gramaticalmente toda a primeira frase, que está na base do estatuto do canto gregoriano: o sujeito é “Ecclesia”, a Igreja.
É a Igreja, de facto, que reconhece o gregoriano como o canto próprio da liturgia romana. É importante recordar o sujeito. Este acto de reconhecimento é um acto eclesial, no sentido mais profundo do termo. É a própria Igreja que, considerando-se a si mesma, a sua realidade, a sua história, define algo. É uma acção magisterial, e no sentido mais elevado do termo, visto que se trata de uma definição conciliar. Esta acção da Igreja, reconhecida pela própria Igreja como uma acção própria, uma acção que lhe pertence, é uma acção que lhe compete naturalmente como “mater et magistra” e enquanto “lumen gentium”; categorias, estas últimas, que certamente se aplicam à Igreja Católica em áreas bem mais importantes, mas que, de qualquer forma, definem o seu papel de discernimento e guia e, consequentemente e em última instância, a sua potestas legislativa. É portanto a Igreja qua talis, e não o indivíduo, quem determina o que ela é, o que pertence à Igreja, o que lhe é próprio, o que a distingue e, no caso da liturgia, também quem regula cada parte, incluindo o canto, como muito bem nos lembra SC 22: “Regular a sagrada liturgia pertence unicamente à autoridade da Igreja, a qual reside na Sé Apostólica e, de acordo com o direito, no bispo... dentro dos limites determinados pelas conferências episcopais... Por consequência, absolutamente ninguém mais, mesmo que seja sacerdote, ouse, por sua própria iniciativa, acrescentar, retirar ou alterar qualquer coisa em matéria litúrgica”. E esta ação eclesial de discernimento e regulamentação, no nosso caso, diz respeito ao canto gregoriano. É importante reiterar que se trata de uma ação eclesial e magisterial, autorizada e autoritativa, porque isto deveria automaticamente redimensionar qualquer veleidade de superar o ditame conciliar com simples opiniões pessoais, que, embora possam ser formuladas por eminentes estudiosos e eclesiásticos, permanecem o que são: opiniões pessoais. Respeitabilíssimas, mas que certamente não têm a força cogente e obrigatória de um ditame conciliar, a menos que se ponha em causa toda a natureza e estrutura da Igreja...

De que acção se trata? “Ecclesia agnoscit”: a Igreja reconhece, diz a tradução oficial. O verbo latino utilizado, porém, é semanticamente bem mais eficaz e esclarecedor. Agnoscere (ad-gnoscere), de facto, com a sua partícula prefixal ad-, indica uma operação cognitiva realizada através de um discernimento, uma escolha efectuada em relação a alguns ou muitos elementos, a partir dos quais se escolhe e seleciona o objecto reconhecido como próprio, como pertencente a si mesmo. Este reconhecimento selectivo é operado graças a elementos reconhecíveis imediata e naturalmente pelo sujeito, com os quais se reencontra, se identifica, e admite estarem presentes no objeto. O sujeito - a Igreja - encontra portanto no canto gregoriano elementos que lhe permitem afirmar que é o canto próprio da liturgia romana, o canto próprio da sua liturgia, enxertando uma equivalência fundamental entre a sua liturgia e o canto que a esta liturgia corresponde, e que, consequentemente, passa a ser o “seu” canto [5]. A Igreja encontra no canto gregoriano elementos que a reconduzem inequivocamente à sua liturgia, tanto que se pode dizer que a liturgia e o canto gregoriano são partes indistintas um do outro. O valor deste reconhecimento é dado precisamente pelo uso do verbo latino agnoscere. Na verdade, para um “reconhecer” mais vago e menos cogente, estão disponíveis outros verbos latinos: reconhecer no sentido de aprovar e elogiar teria exigido o verbo laudare ou probare; no sentido de apreciar o verbo magni facere ou indicare; no sentido de distinguir cernere ou discernere; no sentido de considerar, porém, o verbo mais adequado teria sido extimare ou habere. Além disso, há toda uma área semântica legalística conexa ao verbo agnoscere que deve ter em conta: este verbo é usado para reconhecer um filho como legítimo, uma pessoa como cidadão, uma coisa como propriedade. Finalmente, a partícula prefixa ad indica um movimento ascendente, um trazer à luz, um manifestar duma verdade diante de todos e para todos. O reconhecimento da parte da Igreja do canto gregoriano como canto próprio da liturgia romana reveste-se, portanto, de todos estes significados e não pode ser reconduzido ou reduzido a uma piedosa exortação ou a uma genérica indicação de máxima.

[5] Precisamente por isto, o Motu proprio Tra le sollecitudini afirmava que o gregoriano é “o canto próprio da Igreja Romana”, fazendo a equivalência entre Igreja e liturgia e entre liturgia e canto.

Se tal é a acção realizada pelo sujeito Ecclesia, qual é o conteúdo desta operação de reconhecimento? O canto gregoriano é reconhecido como “próprio” da liturgia romana. O conceito de proprio, seja no original latino proprium ou na tradução italiana “proprio” [6], refere-se a algo exclusivo, pertencente a, característico e peculiar, preciso e especial.
Próprio, de facto, quer dizer, em primeiro lugar, propriedade. Diz-se do que pertence em modo inequívoco a alguém, do que é verdadeiramente seu e não de outros, constituindo, em sentido adjectival, uma característica identificadora.
Próprio também se diz apropriado: a qualidade peculiar, que pertence íntima e singularmente ao objecto, distinguindo-o de qualquer outro. Diz-se de uma palavra ou locução que expressa com exactidão a ideia que quer significar: o uso exacto, e não aproximado. Em sentido figurado significa também “ordenado” e “decoroso”, chegando à função adverbial de “exactamente” e “precisamente”, reforçando o conceito da palavra que determina [6b].
E se passarmos da semântica à filosofia e precisamente à lógica aristotélica, o “próprio” é um dos quatro predicáveis: é o que é inerente ao ser sem contudo defini-lo, é o que faz referência ao ser mesmo que não o inclua totalmente. No nosso caso, o canto gregoriano, reconhecido como pertencente à liturgia da Igreja, é inerente à Igreja mas sem a definir. A Igreja, de facto, é um sujeito mais amplo que o canto gregoriano, o qual obviamente não esgota toda a actividade ou essência da Igreja, mas, todavia, sendo “próprio” da liturgia da Igreja, é-lhe um elemento constitutivo que lhe permite a identificação como Igreja e enquanto Igreja. Em palavras simples: quem diz gregoriano diz inequivocamente Igreja. Mesmo que nem sempre o contrário seja verdadeiro: de facto, quem diz Igreja diz gregoriano, se, e só se, da actividade da Igreja se limita a considerar-lhe o aspecto musical, sendo o gregoriano reconhecido como proprium em relação aos aspectos musicais da liturgia da Igreja. liturgia. E, no entanto, o nexo entre Igreja e canto gregoriano, por via desse “proprium”, é talmente forte que a correspondência, pelo menos no mundo cultural ocidental, é certamente biunívoca [7].

[6] Mas esta ênfase também pode ser reconhecida em outras línguas neolatinas: as traduções oficiais em francês e espanhol, de facto, rezam propre e propio. O alemão também usa um termo semelhante: eigenen; ao passo que o inglês usa a perífrase “specially suited to the Roman liturgy”, que entra num campo semânthttps://divinicultussanctitatem.blogspot.com/ico diverso e mais débil: “um canto particularmente adequado à liturgia romana”, um exemplo claro de tradução por traição.

[6b] N. do T.: em italiano, "proprio" pode equivaler a "propriamente dito".

[7] Prova irrefutável disto mesmo são as “inserções” de melodias gregorianas em contextos particulares (ópera lírica, música pop rock e disco...) quando se quer recordar imediatamente o mundo religioso e cultual católico.

Esta lógica precisa e férrea contida no ditame conciliar que define de modo totalmente exclusivo o canto gregoriano é apoiada pelo parágrafo seguinte de SC116, onde se fala de “alia genera musicae sacrae”. Note-se bem que o original latino, assim construído, deve ser traduzido como “outros géneros de música sacra” [8] e não “os outros géneros de música sacra” como acontece na tradução oficial italiana, tanto mais que quer a versão oficial alemã quer a inglesa traduzem justa e respectivamente como “andere Arten der Kirchenmusik” e “other kinds of sacred music”, sem artigo, tornando assim ainda mais evidente o distanciamento entre o canto gregoriano e o resto da música, ainda que identificada como “sacrmelhora”. Este distaque, semântico e conceptual ao mesmo tempo, faz sim com que a definição de “canto próprio” aponte o canto gregoriano não como um repertório entre tantos, mas algo diferente de todos os outros repertórios possíveis, tornando-o justamente o “canto próprio da liturgia romana”. Poderemos dizer O canto da Igreja, o canto por excelência e por antonomásia da Igreja e da sua liturgia. Seria, de facto, sobremanira redutor considerar o canto gregoriano apenas como um elemento musical dentro da liturgia. A linguagem sonora, por assim dizer a música, dá corpo ao gregoriano, mas o canto gregoriano não é apenas música, é algo mais: é a forma musical da liturgia e, consequentemente, é ele próprio liturgia. É liturgia no sentido mais elevado do termo, liturgia em canto, liturgia que se faz canto, canto que se faz liturgia; não música dentro de um contexto litúrgico, mas liturgia pura e simples que, pela sua própria natureza, nasce “com” e “por meio” do canto e só daquele canto concreto que é o canto gregoriano. Precisamente porque a forma musical da liturgia, como tudo o que diz respeito à liturgia, acaba por ser uma obra de fé e de arte que transcende as fronteiras do tempo e os condicionamentos das culturas, ao contrário de outros repertórios, e por isso mesmo não pode considerar-se um repertório entre tantos repertórios. Ou seja, trata-se de um corpus musical que ultrapassa as fronteiras históricas para se tornar, em certo sentido, meta-histórico. Se, na verdade, o chamado “fundo autêntico” do gregoriano nasce entre os séculos IV e VIII, enxertando-se sobre material musical dos três primeiros séculos do cristianismo, também é verdade que cada celebração acrescentada ao calendário litúrgico foi acompanhada de composições que poderiam ser emprestadas de outras celebrações, mas que, quando compostas ex-novo, vinham confeccionadas respeitando, se bem que por vezes com resultados desiguais, as características composicionais próprias do canto gregoriano; e isto aconteceu até meados do século passado [9]. Uma operação que talvez nos pareça estranha e possa ser acusada de academicismo, mas que indica a vontade de nos atermos a um modelo muito específico, a um determinado "som", a uma “música própria”. Inserido nos livros litúrgicos oficiais, o gregoriano torna-se não mais a expressão musical de um determinado período histórico, mas sim um canto da Igreja; assim acontece, por exemplo, com todo o material eucológico que, embora atribuível à intervenção de um autor determinado, a partir do momento em que se funde no Missal, torna-se liturgia da Igreja. Em segundo lugar, trata-se de um corpus musical que atravessa fronteiras culturais para se tornar metacultural. A sua evolução músico-modal baseia-se em alguns sons e intervalos que pertencem a todas as culturas do Mediterrâneo e do Médio Oriente, utilizados por estas culturas quando querem trazer para a dimensão do sagrado uma determinada expressão musical [10]. Aqui reside a verdadeira raiz da música sacra. São elementos ancestrais que tocam particulares cordas de ressonâncias espirituais e emocionais e que encontramos no nosso “subconsciente” musical e religioso; ignorar ou pior negar esta realidade significaria negar o evidente. Não se trata, portanto, apenas de textos sagrados revestidos de qualquer estrutura melódica, mas de textos tornados musicalmente “sacros” por meio de particulares sons e intervalos, utilizados de modo exclusivo e capazes de evocar um mundo musicalmente “outro” que não o quotidiano. O canto gregoriano pertence a este género de música; nele e por meio dele nasceu e construiu-se a liturgia da Igreja.

[8] Aqui “género” deve ser entendido em sentido geral e não estritamente técnico-musical tendo em base critérios formais e estilísticos. Também neste caso a terminologia utilizada deve-se a Tra le sollecitudini. Sobre os géneros musicais na liturgia, ver JOSEPH GELINEAU, Canto e musica nel culto cristiano, LDC Torino 1963, pp 183ss., ao qual fazem referência todos os estudos subsequentes.

[9] Como prescrevia ainda a encíclica Musicae Sacrae Disciplina (1955): para as festas recentemente introduzidas, novas melodias deveriam ser compostas "por mestres verdadeiramente competentes, de modo que se observem fielmente as leis próprias do verdadeiro canto gregoriano, e as novas composições porfiem, em valor e pureza, com as antigas.

[10] Cfr. em particular as obras de JACQUES VIRET: Id., Le chant gregorien, Paris 2012, pp 15ss; Id., Le Chant grégorien, musique de la parole sacrée, Lausanne 1986; Id., La modalité grégorienne: un language pour quel message? Lyon, 1987. Viret mete em evidência não tanto as raízes hebraicas do canto gregoriano, mas sobretudo aquelas ligadas à oratória clássica e sobretudo aquelas comuns ao substrato mais antigo das populações europeias e da bacia mediterrânica, ligadas à tradição oral (e consequentemente à memorização textual) e a uma certa música primordial que atravessa todas as grandes sociedades do passado, sugerindo também uma interpretação da monodia gregoriana muito vizinha dos modelos orientais. Trata-se de um ramo da etnologia e da antropologia da música que deveria ser profundamente investigado. Ver também MAURICE EMMANUEL (ed), L'Histoire de la langue musicale : complété d'un aperçu d'éthnomusicologie par Jacques Viret. Tome 1, antiquité - moyen âge, Paris, Henry Laurens ed., 1981.

O que o Vaticano II afirmou, portanto, longe de ser uma “exaltação romântica” [11] é a escolha preferencial da Igreja. Uma escolha pastoral ponderada, exclusiva, unívoca, que exige uma adesão inteligente e construtiva. Uma escolha que, no que diz respeito a outras disciplinas artísticas como a arquitectura, a pintura, a escultura, a Igreja nunca fez, precisamente porque expressões artísticas não tão intimamente ligadas à liturgia (como o está o canto gregoriano) mas consideradas justamente elementos acessórios e secundários e, por isto, passíveis de estarem também ligadas ao passar do tempo e à mudança de gostos. Com o canto gregoriano não se trata de gosto, pessoal ou comunitário, mas do que é constitutivo, musicalmente falando, da oração litúrgica da Igreja - que nasce sempre como oração cantada - e, consequentemente, da própria Igreja, como reiterado pelo adágio “lex orandi statuat lex credendi” [12]. Em última análise, o canto gregoriano é a única expressão musical que resume em si totalmente e no máximo grau aquela característica principal e exclusiva da música sacra expressa no n.º 112 da Sacrosanctum Concilium: “A música sacra será, por isso, tanto mais santa quanto mais intimamente unida estiver à acção litúrgica”.

[11] Esta e outras expressões semelhantes foram formuladas numa conferência que pode muito bem ser considerada precursora de uma interpretação diferente do ditame conciliar e que conduziu efectivamente ao redimensionamento do canto gregoriano, considerado um entre outros repertórios históricos. Cfr. GINO STEFANI, “Friburgo: Prima settimana mondiale della nuova musica sacra”, in Rivista Liturgica, ano 1965, n°4, pp.492-498. A visão do conhecido semiólogo musical Gino Stefani (1929-2019), ex-jesuíta, cujo pensamento antropocêntrico e uma semiologia da música “funcional aos ritos” encontra em “L'espressione vocale e musicale nella liturgia", Torino-Leumann, LDC 1967, o seu manifesto, condicionou não pouco os debates e as práticas subsequentes com uma evolução descendente da prática musical italiana na liturgia.

[12] É o axioma cunhado com toda a probabilidade por Próspero da Aquitânia (†455) e que encontramos codificado no Indiculus de gratia, por ele compilado sob o pontificado de Leão Magno: “ut legem credendi lex statuat supplicandi” cuja tradução é “a fim que a lei da oração estabeleça a lei da fé”. Sobre a história, o significado e o alcance deste axioma teológico, cfr. CESARE GIRAUDO, In unum corpus. Trattato mistagogico sull’eucaristia, San Paolo, Cinisello Balsamo 2001, pp. 22-32.

Se esta é a condição do canto gregoriano que a Igreja oficialmente lhe reconhece, é claro que pô-lo ao mesmo nível doutros tipos de repertório musical é uma operação culturalmente insustentável e eclesialmente impossível, visto que a própria Igreja, como me parece haver evidenciado, com o termo “canto próprio” quis reconhecer ao gregoriano um estatuto particular e exclusivo, metendo no mesmo plano a liturgia nos seus conteúdos textuais com o seu revestimento musical, composto para estender da melhor forma no tempo e no espaço precisamente aquele determinado conteúdo e permitir assim à liturgia a sua máxima eficácia possível em ordem aos fins a que ela própria se propõe e para os quais existe: a glória de Deus e a santificação dos fiéis (SC 112).

quinta-feira, 3 de março de 2011

O Canto Gregoriano no Magistério da Igreja

Temos vindo a propor a leitura dos documentos que constituem o Magistério da Igreja sobre a Música Litúrgica — começámos como o motu proprio de S. Pio X Tra le sollecitudini, prosseguimos com a encíclica Musicæ Sacræ Disciplina do Venerável Pio XII e, mais recentemente, apontámos para o Quirógrafo do Papa João Paulo II no centenário de Tra le sollecitudini.

Pretendemos continuar a fazê-lo, mas pareceu-nos oportuno e conveniente elaborar uma súmula — necessariamente subjectiva e defectiva — que desse uma visão diacrónica da predilecção da Igreja pelo Canto Gregoriano e de como foi e continua a ser o «canto próprio da liturgia romana », o qual deve ter «por isso, na acção litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o primeiro lugar».

Ei-la:


O Canto Gregoriano no Magistério da Igreja

Bento XVI
Exortação apostólica pós-sinodal Verbum Domini (Setembro, 2010):

Canto litúrgico biblicamente inspirado
70. No âmbito da valorização da Palavra de Deus durante a celebração litúrgica, tenha-se presente também o canto nos momentos previstos pelo próprio rito, favorecendo o canto de clara inspiração bíblica capaz de exprimir a beleza da Palavra divina por meio de um harmonioso acordo entre as palavras e a música. Neste sentido, é bom valorizar aqueles cânticos que a tradição da Igreja nos legou e que respeitam este critério; penso particularmente na importância do canto gregoriano.

Exortação apostólica pós-sinodal Sacramentum Caritatis (Fevereiro, 2007):

O canto litúrgico
42. Na arte da celebração, ocupa lugar de destaque o canto litúrgico. (…) Verdadeiramente, em liturgia, não podemos dizer que tanto vale um cântico como outro; a propósito, é necessário evitar a improvisação genérica ou a introdução de géneros musicais que não respeitem o sentido da liturgia. Enquanto elemento litúrgico, o canto deve integrar-se na forma própria da celebração; consequentemente, tudo — no texto, na melodia, na execução — deve corresponder ao sentido do mistério celebrado, às várias partes do rito e aos diferentes tempos litúrgicos. Enfim, (…) desejo — como foi pedido pelos padres sinodais — que se valorize adequadamente o canto gregoriano, como canto próprio da liturgia romana.

A língua latina
62. (…) [P]enso, neste momento, em particular, nas celebrações que têm lugar durante encontros internacionais, cada vez mais frequentes hoje, e que devem justamente ser valorizadas. A fim de exprimir melhor a unidade e a universalidade da Igreja, quero recomendar o que foi sugerido pelo Sínodo dos Bispos, em sintonia com as directrizes do Concílio Vaticano II: (…) sejam igualmente recitadas em latim as orações mais conhecidas da tradição da Igreja e, eventualmente, entoadas algumas partes em canto gregoriano. A nível geral, peço que os futuros sacerdotes sejam preparados, desde o tempo do seminário, para compreender e celebrar a Santa Missa em latim, bem como para usar textos latinos e entoar o canto gregoriano; nem se transcure a possibilidade de formar os próprios fiéis para saberem, em latim, as orações mais comuns e cantarem, em gregoriano, determinadas partes da liturgia.


João Paulo II
Quirógrafo no centenário do motu proprio «Tra le Sollecitudini» sobre a Música Sacra (Novembro, 2003):

7. Entre as expressões musicais que mais correspondem à qualidade requerida pela noção de música sacra, particularmente a litúrgica, o canto gregoriano ocupa um lugar particular. O Concílio Vaticano II reconhece-o como "canto próprio da liturgia romana" à qual é preciso reservar, na igualdade das condições, o primeiro lugar nas acções litúrgicas celebradas com canto em língua latina. São Pio X ressaltava que a Igreja "o herdou dos antigos Padres", "guardando-o ciosamente durante os séculos nos seus códigos litúrgicos" e ainda hoje o "propõe aos fiéis" como seu, considerando-o "como supremo modelo de música sacra". O canto gregoriano, portanto, continua a ser também hoje, um  elemento  de  unidade  na  liturgia romana. (…)


Sacra Congregação para os Ritos
Instrução Musicam Sacram (Março, 1967)

50. Nas acções litúrgicas com canto que se celebram em latim:
a) O canto gregoriano, como próprio da Liturgia romana, em igualdade de circunstâncias ocupará o primeiro lugar. Empreguem-se oportunamente para isso as melodias que se encontram nas edições típicas. (…)

52. Para conservar o tesouro da Música Sacra e promover devidamente novas criações, "dê-se grande importância nos Seminários, Noviciados e casas de estudo de religiosos de ambos os sexos, bem como noutros institutos e escolas católicas, à formação e prática musical", mas, sobretudo, nos Institutos Superiores especialmente destinados a isto. Deve promover-se antes de mais o estudo e a prática do canto gregoriano, já que, pelas suas qualidades próprias, continua a ser uma base de grande valor para o cultivo da Música
Sagrada.


Concílio Vaticano II
Constituição Conciliar Sacrosanctum Concilium sobre a Sagrada Liturgia (Dezembro, 1963)

112. A tradição musical da Igreja é um tesouro de inestimável valor, que excede todas as outras expressões de arte, sobretudo porque o canto sagrado, intimamente unido com o texto, constitui parte necessária ou integrante da Liturgia solene. (…)

116. A Igreja reconhece como canto próprio da liturgia romana o canto gregoriano; terá este, por isso, na acção litúrgica, em igualdade de circunstâncias, o primeiro lugar.


Pio XII
Carta Encíclica Musicæ Sacræ Disciplina sobre a Música Sacra (Dezembro, 1955)

Santidade, carácter artístico e universalidade da música litúrgica
20. Deve ser "santa"; não admita ela em si o que soa de profano, nem permita se insinue nas melodias com que é apresentada. A essa santidade se presta sobretudo o canto gregoriano, que desde tantos séculos se usa na Igreja, a ponto de se poder dizê-lo património seu. Pela íntima adesão das melodias às palavras do texto sagrado, esse canto não só quadra a este plenamente, mas parece quase interpretar-lhe a força e a eficácia (…). Conservar cuidadosamente esse precioso tesouro do canto gregoriano e fazer o povo amplamente participante dele, compete a todos aqueles a quem Jesus Cristo confiou a guarda e a dispensação das riquezas da Igreja. Por isso, aquilo que os nossos predecessores São Pio X (…) e Pio XI sabiamente ordenaram e inculcaram, também nós queremos e prescrevemos que se faça, prestando-se atenção às características que são próprias do genuíno canto gregoriano; isto é, que na celebração dos ritos litúrgicos se faça largo uso desse canto, e se providencie com todo cuidado para que ele seja executado com exactidão, dignidade e piedade. (...)

21. Se em tudo essas normas forem realmente observadas, vir-se-á outrossim a satisfazer pelo modo devido uma outra propriedade da música sacra, isto é, que ela seja "verdadeira arte"; e, se em todas as Igrejas católicas do mundo ressoar incorrupto e íntegro o canto gregoriano, também ele, como a liturgia romana, terá a nota de "universalidade", de modo que os féis em qualquer parte do mundo ouçam essas harmonias como familiares e como coisa de casa, experimentando assim, com espiritual conforto, a admirável unidade da Igreja. É esse um dos motivos principais por que a Igreja mostra tão vivo desejo de que o canto gregoriano esteja intimamente ligado às palavras latinas da sagrada liturgia.

22. (…) [C]uidem atentamente os ordinários e os outros sagrados pastores, que desde a infância os fiéis aprendam ao menos as melodias gregorianas mais fáceis e mais em uso, e saibam valer-se delas nos sagrados ritos litúrgicos (…).


Carta Encíclica Mediator Dei sobre a Sagrada Liturgia (Novembro, 1947)

176. (…) O canto gregoriano que a Igreja romana considera coisa sua, porque recebido da antiga tradição e guardado no correr dos séculos sob a sua cuidadosa tutela e que propõe aos fiéis como coisa também deles, prescrito como é de modo absoluto em algumas partes da liturgia, não só acrescenta decoro e solenidade à celebração dos divinos mistérios, antes contribui extremamente até para aumentar a fé e a piedade dos assistentes. (…)



Pio X
Motu Proprio Tra le Sollecitudini sobre a Música Sacra (Novembro, 1903)

3. Estas qualidades [santidade, delicadeza das formas, universalidade] encontram-se em sumo grau no canto gregoriano, que é, por consequência, o canto próprio da Igreja Romana, o único que ela herdou dos antigos Padres, que conservou cuidadosamente no decurso dos séculos em seus códigos litúrgicos e que, como seu, propõe directamente aos fiéis (...).
Por tais motivos, o canto gregoriano foi sempre considerado como o modelo supremo da música sacra (…).
O canto gregoriano deverá, pois, restabelecer-se amplamente nas funções do culto sendo certo que uma função eclesiástica nada perde da sua solenidade, mesmo quando não é acompanhada senão da música gregoriana.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Quirógrafo do Papa João Paulo II comemorando o centenário de Tra le sollecitudini (1903-2003)

Aproveitemos a beatificação próxima do Venerável
Papa João Paulo II para lermos os seus ensinamentos
e pedirmos a sua poderosa intercessão por todas
as scholæ cantorum que "desenvolve[m] na
assembleia a função de guia e de sustento e,
nalguns momentos da Liturgia,
desempenha[m] a sua função específica."


1. Impelido por um profundo desejo "de manter e de promover o decoro da Casa de Deus", o meu Predecessor São Pio X emanava, há cem anos, o Motu proprio Tra le sollecitudini, que tinha como objecto a renovação da música sacra nas funções do culto. Com isso, ele pretendia oferecer à Igreja indicações concretas naquele sector vital da Liturgia, apresentando-a "quase como um código jurídico da música sacra"(1). Tal intervenção, igualmente, fazia parte do programa do seu pontificado, que ele tinha resumido no dístico: "Instaurare omnia in Christo".

A data centenária do documento oferece-me a ocasião para destacar a importante função da música sacra, que São Pio X apresenta seja como um meio de elevação do espírito a Deus, seja como ajuda para os fiéis na "participação activa nos sacrossantos mistérios e na oração pública e solene da Igreja"(2).

A especial atenção que é necessário reservar à música sacra - recorda o Santo Pontífice - deriva do facto de que, "como parte integrante da solene liturgia, dela faz parte a finalidade geral que é a glória de Deus e a santificação e a edificação dos fiéis"(3). Interpretando e expressando o sentido profundo do sagrado texto ao qual está intimamente unida, ela é capaz de "acrescentar maior eficácia ao mesmo texto, para que os fiéis [...] se disponham melhor para acolher em si os frutos da graça, que são próprios da celebração dos sacrossantos mistérios"(4).

2. Este delineamento foi retomado pelo Concílio Ecuménico Vaticano II, no capítulo VI da Constituição Sacrosanctum concilium sobre a sagrada Liturgia, onde menciona com clareza a função eclesial da música sacra:  "A tradição musical de toda a Igreja constitui um património de inestimável valor, que sobressai entre as outras expressões de arte, especialmente pelo facto de que o canto sacro, unido às palavras, é uma parte necessária e integral da liturgia solene"(5). O Concílio recorda, ainda, que "o canto sacro é elogiado seja pela Sagrada Escritura, seja pelos Padres, seja ainda pelos Pontífices Romanos que recentemente, a começar por São Pio X, sublinharam com insistência a tarefa ministerial da música sacra no serviço divino"(6).

Continuando, de facto, a antiga tradição bíblica, à qual o mesmo Senhor e os Apóstolos se mantiveram apegados (cf. Mt 26, 30 ["Depois de cantarem os salmos, saíram para o Monte das Oliveiras."]Ef 5, 19 ["entre vós, cantai salmos, hinos e cânticos espirituais; cantai e louvai o Senhor com todo o vosso coração"]Cl 3, 16 ["A palavra de Cristo habite em vós com toda a sua riqueza: ensinai-vos e admoestai-vos uns aos outros com toda a sabedoria; cantai a Deus, nos vossos corações, o vosso reconhecimento, com salmos, hinos e cânticos inspirados."])a Igreja, ao longo de toda a sua história, favoreceu o canto nas celebrações litúrgicas, oferecendo, segundo a criatividade de cada cultura, maravilhosos exemplos de comentário melódico dos textos sagrados, nos ritos tanto do Ocidente como do Oriente.

Portanto, foi constante a atenção dos meus Predecessores a este delicado sector, a propósito do qual foram evocados os princípios fundamentais que devem animar a produção da música sacra, especialmente destinada à Liturgia. Além do Papa São Pio X, devem ser recordados, entre outros, os Papas Bento XIV, com a Encíclica Annus qui (19 de Fevereiro de 1749); Pio XII, com as Encíclicas Mediator Dei (20 de Dezembro de 1947) e Musicae sacrae disciplina (25 de Dezembro de 1955); e, finalmente, Paulo VI, com os luminosos pronunciamentos que disseminou em múltiplas oportunidades.

Os Padres do Concílio Vaticano II não deixaram de reforçar tais princípios, em vista da sua aplicação às condições transitórias dos tempos. Fizeram-no num capítulo especial, o sexto, da Constituição Sacrosanctum conciliumO Papa Paulo VI procedeu, pois, à tradução daqueles princípios em normas concretas, sobretudo por meio da Instrução Musicam sacram [tradução não oficial para o português]emanada com a sua aprovação em 5 de Março de 1967, pela então Sagrada Congregação para os Ritos. É preciso voltar constantemente àqueles princípios de inspiração conciliar, para promover, em conformidade com as exigências da reforma litúrgica, um desenvolvimento que esteja, também neste campo, à altura da tradição litúrgico-musical da Igreja. O texto da Constituição Sacrosanctum concilium onde se afirma que a Igreja "aprova e admite no culto todas as formas de verdadeira arte, dotadas das devidas qualidades"(7), encontra os critérios adequados de aplicação nos nn. 50-53 da Instrução Musicam sacram, agora mencionada(8).

3. Em diferentes ocasiões, também eu me referi à preciosa função e à grande importância da música e do canto para uma participação mais activa e intensa nas celebrações litúrgicas(9), e sublinhei a necessidade de "purificar o culto de dispersões de estilos, das formas descuidadas de expressão, de músicas e textos descurados e pouco conformes com a grandeza do acto que se celebra"(10), para assegurar dignidade e singeleza das formas à música litúrgica.

Em tal perspectiva, à luz do magistério de São Pio X e dos meus outros Predecessores, e considerando em particular os pronunciamentos do Concílio Vaticano II, desejo repropor alguns princípios fundamentais para este importante sector da vida da Igreja, com a intenção de fazer com que a música sacra corresponda cada vez mais à sua função específica.

4. Em conformidade com os ensinamentos de São Pio X e do Concílio Vaticano II, é preciso sublinhar acima de tudo que a música destinada aos sagrados ritos deve ter como ponto de referência a santidade:  ela, de facto, "será tanto mais santa quanto mais estreitamente for unida à acção litúrgica"(11). Por este exacto motivo, "não é indistintamente tudo aquilo que está fora do templo (profanum) que é apto a ultrapassar-lhe os umbrais", afirmava sàbiamente o meu venerável Predecessor Paulo VI, comentando um decreto do Concílio de Trento(12)  e destacava que "se não se possui ao mesmo tempo o sentido da oração, da dignidade e da beleza, a música instrumental e vocal impede por si o ingresso na esfera do sagrado e do religioso"(13). Por outro lado, a mesma categoria de "música sacra" recebeu hoje um alargamento de significado, a ponto de incluir repertórios que não podem entrar na celebração sem violar o espírito e as normas da mesma Liturgia.

A reforma realizada por São Pio X visava especificamente purificar a música de igreja da contaminação da música profana teatral, que em muitos países tinha poluído o repertório e a prática musical litúrgica. Também nos nossos tempos é preciso considerar atentamente, como evidenciei na Encíclica Ecclesia de Eucharistiaque nem todas as expressões de artes figurativas e de música são capazes de "expressar adequadamente o Mistério lido na plenitude de fé da Igreja"(14). Consequentemente, nem todas as formas musicais podem ser consideradas aptas para as celebrações litúrgicas.

5. Outro princípio enunciado por São Pio X no Motu proprio Tra le sollecitudini, princípio este intimamente ligado ao precedente, é o da singeleza das formas. Não pode existir uma música destinada à celebração dos sagrados ritos que não seja, antes, "verdadeira arte", capaz de ter a eficácia "que a Igreja deseja obter, acolhendo na sua liturgia a arte dos sons"(15).

Todavia, esta qualidade por si só não é suficiente. A música litúrgica deve, de facto, responder aos seus requisitos específicos: a plena adesão aos textos que apresenta, a consonância com o tempo e o momento litúrgico para o qual é destinada, a adequada correspondência aos gestos que o rito propõe. Os vários momentos litúrgicos exigem, de facto, uma expressão musical própria, sempre apta a fazer emergir a natureza própria de um determinado rito, ora proclamando as maravilhas de Deus, ora manifestando sentimentos de louvor, de súplica ou ainda de melancolia pela experiência da dor humana, uma experiência, porém, que a fé abre à perspectiva da esperança cristã.

6. Os cantos e as músicas exigidos pela reforma litúrgica - é bom sublinhá-lo - devem corresponder também às legítimas exigências de adaptação e de inculturação. É evidente, porém, que cada inovação nesta delicada matéria deve respeitar os critérios peculiares, como a investigação de expressões musicais, que correspondam à participação necessária de toda a assembleia na celebração e que evitem, ao mesmo tempo, qualquer concessão à leviandade e à superficialidade. É necessário, portanto, evitar, em última análise, aquelas formas de "inculturação", em sentido elitário [=elitista], que introduzem na Liturgia composições antigas ou contemporâneas que possuem talvez um valor artístico, mas que induzem a uma linguagem realmente incompreensível.

Neste sentido, São Pio X indicava usando o termo universalidade um ulterior requisito da música destinada ao culto:  "(...) embora seja permitido a cada nação admitir nas composições religiosas aquelas formas particulares, que em certo modo constituem o carácter específico da sua música própria, estas devem ser de tal maneira subordinadas aos caracteres gerais da música sacra que ninguém doutra nação, ao ouvi-las, sinta uma impressão desagradável."(16). Por outras palavras, o espaço sagrado da celebração litúrgica jamais deve tornar-se um laboratório de experiências ou de práticas de composição e de execução, introduzidas sem uma verificação atenta.

7. Entre as expressões musicais que mais correspondem à qualidade requerida pela noção de música sacra, particularmente a litúrgica, o canto gregoriano ocupa um lugar particular. O Concílio Vaticano II reconhece-o como "canto próprio da liturgia romana"(17) à qual é preciso reservar, na igualdade das condições, o primeiro lugar nas acções litúrgicas celebradas com canto em língua latina(18). São Pio X ressaltava que a Igreja "o herdou dos antigos Padres", "guardando-o zelosamente durante os séculos nos seus códigos litúrgicos" e ainda hoje o "propõe aos fiéis" como seu, considerando-o "como supremo modelo de música sacra"(19). O canto gregoriano, portanto, continua a ser também hoje, um  elemento de unidade na liturgia romana.

Como já fazia São Pio X, também o Concílio Vaticano II reconhece que "os outros géneros de música sacra, e especialmente a polifonia, não estão excluídos de modo algum da celebração dos ofícios divinos"(20). É preciso, portanto, avaliar com atenção as novas linguagens musicais, para recorrer à possibilidade de expressar também com elas as inextinguíveis riquezas do Mistério reproposto na Liturgia e favorecer assim a participação activa dos fiéis nas diversas celebrações (21).

8. A importância de conservar e de incrementar o património secular da Igreja leva a ter em particular consideração uma exortação específica da Constituição Sacrosanctum concilium: "Promovam-se com empenho, sobretudo nas Igrejas Catedrais, as "Scholae Cantorum". Por sua vez, a Instrução Musicam sacram determina a função ministerial da schola:  "É digno de particular atenção, para o serviço litúrgico que desenvolve, o coro ou a capela musical ou ainda a schola cantorum(23). No que se refere às normas conciliares da reforma litúrgica, a sua tarefa tornou-se ainda mais relevante e importante: deve, realmente, prover à execução exacta das partes que lhe são próprias, segundo os diversos tipos de cânticos, e favorecer a participação activa dos fiéis no canto. Portanto [...] promova-se com especial cuidado especialmente nas catedrais e nas outras igrejas maiores, nos seminários e nas casas de formação religiosas, um coro ou uma capela musical ou ainda uma schola cantorum". A tarefa da schola não foi diminuída: ela, de facto, desenvolve na assembleia a função de guia e de sustento e, nalguns momentos da Liturgia, desempenha a sua função específica.

Da boa coordenação de todos o sacerdote celebrante e o diácono, os acólitos, os ministros, os leitores, o salmista, a schola cantorum, os músicos, o cantor e a assembleia decorre aquele clima espiritual que torna o momento litúrgico realmente intenso, participado e frutífero. O aspecto musical das celebrações litúrgicas, portanto, não pode ser relegado nem à improvisação nem ao arbítrio de pessoas individualmente, mas há-de ser confiado a uma direcção harmoniosa, no respeito pelas normas e as competências, como significativo fruto de uma formação litúrgica adequada.

9. Também neste campo, portanto, se evidencia a urgência de promover uma formação sólida, quer dos pastores quer dos fiéis leigos. São Pio X insistia particularmente sobre a formação musical do clero. Uma insistência neste sentido foi reforçada também pelo Vaticano II:  "Dê-se-lhes grande importância nos Seminários, nos Noviciados dos religiosos e das religiosas e nas casas de estudo, assim como noutros institutos e escolas católicas"(24). Esta indicação ainda deve ser plenamente realizada. Portanto, considero oportuno recordá-la, para que os futuros pastores possam adquirir uma sensibilidade adequada também neste campo.

Nesta obra formativa, um papel especial é desempenhado pelas escolas de música sacra, que São Pio X exortava a apoiar e promover(25), e que o Concílio Vaticano II recomenda a instituir onde for possível(26). Fruto concreto da reforma de São Pio X foi a erecção em Roma, em 1911, oito anos depois do Motu proprioda "Pontifícia Escola Superior de Música Sacra", que em seguida se tornou "Pontifício Instituto de Música Sacra". Além desta instituição académica, já quase centenária, que desempenhou e ainda desempenha um serviço qualificado na Igreja, existem muitas outras Escolas instituídas nas Igrejas particulares que merecem ser apoiadas e incrementadas para um melhor conhecimento e execução da boa música litúrgica.

10. Dado que a Igreja sempre reconheceu e favoreceu o progresso das artes, não é de se admirar que, além do canto gregoriano e da polifonia, admita nas celebrações também a música moderna, desde que seja respeitosa do espírito litúrgico e dos verdadeiros valores da arte. Portanto, permite-se que as Igrejas nas diversas Nações valorizem, nas composições destinadas ao culto, "aquelas formas particulares que constituem de certo modo o carácter específico da música que lhes é própria"(27). Na linha do meu Predecessor e de quanto se estabeleceu mais recentemente na Constituição Sacrosanctum concilium(28)também eu, na Encíclica Ecclesia de Eucharistia, procurei abrir espaço às novas formas musicais, mencionando juntamente com as inspiradas melodias gregorianas, "os numerosos e, frequentemente, grandes autores que se afirmaram com os textos litúrgicos da Santa Missa" (29).

11. O século passado, com a renovação realizada pelo Concílio Vaticano II, conheceu um desenvolvimento especial do canto popular religioso, do qual a Sacrosanctum concilium diz:  "Promova-se com grande empenhamento o canto popular religioso, para que os fiéis possam cantar, tanto nos exercícios de piedade como nos próprios actos litúrgicos"(30). Este canto apresenta-se particularmente apto para a participação dos fiéis, não apenas nas práticas devocionais, "segundo as normas e o que se determina nas rubricas"(31), mas igualmente na própria Liturgia. O canto popular, de facto, constitui um "vínculo de unidade, uma expressão alegre da comunidade orante, promove a proclamação de uma única fé e dá às grandes assembleias litúrgicas uma incomparável e recolhida solenidade" (32).

12. No que diz respeito às composições musicais litúrgicas, faço minha a "regra geral" que são Pio X formulava com estes termos:  "Uma composição para a Igreja é tanto sacra e litúrgica quanto mais se aproximar, no andamento, na inspiração e no sabor, da melodia gregoriana, e tanto menos é digna do templo, quanto mais se reconhece disforme daquele modelo supremo"(33). Não se trata, evidentemente, de copiar o canto gregoriano, mas muito mais de considerar que as novas composições sejam absorvidas pelo mesmo espírito que suscitou e, pouco a pouco, modelou aquele canto. Somente um artista profundamente mergulhado no sensus Ecclesiae pode procurar compreender e traduzir em melodia a verdade do Mistério que se celebra na Liturgia (34). Nesta perspectiva, na Carta aos Artistas escrevo:  "Quantas composições sacras foram elaboradas, ao longo dos séculos, por pessoas profundamente imbuídas pelo sentido do mistério! Crentes sem número alimentaram a sua fé com as melodias nascidas do coração de outros crentes, que se tornaram parte da Liturgia ou pelo menos uma ajuda muito válida para a sua decorosa realização. No cântico, a fé é sentida como uma exuberância de alegria, de amor, de segura esperança da intervenção salvífica de Deus" (35)(Ed. port. de L'Osserv. Rom. n. 18, pág. 211, n. 12).

Portanto, é necessária uma renovada e mais profunda consideração dos princípios que devem estar na base da formação e da difusão de um repertório de qualidade. Somente assim se poderá permitir que a expressão musical sirva de modo apropriado a sua finalidade última, que "é a glória de Deus e a santificação dos fiéis"(36).

Sei ainda que também hoje não faltam compositores capazes de oferecer, neste espírito, a sua contribuição indispensável e a sua colaboração competente para incrementar o património da música, ao serviço da Liturgia cada vez mais intensamente vivida. Dirijo-lhes a expressão da minha confiança, unida à exortação mais cordial, para que se empenhem com esmero em vista de aumentar o repertório de composições que sejam dignas da excelência dos mistérios celebrados e, ao mesmo tempo, aptas para a sensibilidade hodierna.

13. Por fim, gostaria ainda de recordar aquilo que São Pio X dispunha no plano práctico, com a finalidade de favorecer a aplicação efectiva das indicações apresentadas no Motu proprio. Dirigindo-se aos Bispos, ele prescrevia que instituíssem nas suas dioceses "uma comissão especial de pessoas verdadeiramente competentes em matéria de música sacra"(37). Onde a disposição pontifícia foi posta em prática, não faltaram os frutos. Actualmente, são numerosas as Comissões nacionais, diocesanas e interdiocesanas que oferecem a sua contribuição preciosa para a preparação dos repertórios locais, procurando realizar um discernimento que considere a qualidade dos textos e das músicas. Faço votos a fim de que os Bispos continuem a secundar o esforço destas Comissões, favorecendo-lhes a eficácia no âmbito pastoral(38).
À luz da experiência amadurecida nestes anos, para melhor assegurar o cumprimento do importante dever de regulamentar e promover a sagrada Liturgia, peço à Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos que intensifique a atenção, segundo as suas finalidades institucionais(39), aos sectores da música sacra litúrgica, valendo-se das competências das diversas Comissões e Instituições especializadas nesse campo, como também da contribuição do Pontifício Instituto de Música Sacra. É importante, de facto, que as composições musicais utilizadas nas celebrações litúrgicas correspondam aos critérios enunciados por São Pio X e sàbiamente desenvolvidos, quer pelo Concílio Vaticano II quer pelo sucessivo Magistério da Igreja. Nesta perspectiva, estou persuadido de que também as Conferências episcopais hão-de realizar cuidadosamente o exame dos textos destinados ao canto litúrgico(40), e prestar uma atenção especial à avaliação e promoção de melodias que sejam verdadeiramente aptas para o uso sacro(41).

14. Ainda no plano prático, o Motu proprio do qual se celebra o centenário, aborda também a questão dos instrumentos musicais a serem utilizados na Liturgia latina. Dentre eles, reconhece sem hesitação a prevalência do órgão de tubos, sobre cujo uso estabelece normas oportunas(42). O Concílio Vaticano II acolheu plenamente a orientação do meu Predecessor, estabelecendo:  "Tenha-se grande apreço, na Igreja latina, pelo órgão de tubos, instrumento musical tradicional e cujo som é capaz de trazer às cerimónias do culto um esplendor extraordinário e elevar poderosamente o espírito a Deus e às coisas celestes"(43).
Deve-se, porém, reconhecer que as composições actuais utilizam frequentemente modos musicais diversificados não desprovidos da sua dignidade. Na medida em que servem de ajuda para a oração da Igreja, podem revelar-se como um enriquecimento precioso. É preciso, porém, vigiar a fim de que os instrumentos sejam aptos para o uso sacro, correspondam à dignidade do templo, possam sustentar o canto dos fiéis e favoreçam a sua edificação.

15. Desejo que a comemoração centenária do Motu proprio Tra le sollecitudini, por intercessão do seu santo Autor, conjuntamente com Santa Cecília, Padroeira da música sacra, sirva de encorajamento e estímulo para aqueles que se ocupam deste importante aspecto das celebrações litúrgicas. Os cultores da música sacra, dedicando-se com impulso renovado a um sector de relevância tão vital, contribuem para o amadurecimento da vida espiritual do Povo de Deus. Os fiéis, por sua vez, expressando de modo harmónico e solene a sua própria fé com o canto, experimentarão cada vez mais profundamente a riqueza e harmonizar-se-ão no esforço em vista de traduzir os seus impulsos nos comportamentos da vida quotidiana. Poder-se-á, assim, alcançar, graças ao compromisso concorde dos pastores de almas, dos músicos e dos fiéis, aquilo que a Constituição Sacrosanctum concilium qualifica como verdadeira "finalidade da música sacra", isto é, "a glória de Deus e a santificação dos fiéis"(44).

Nisto, sirva também de exemplo e modelo a Virgem Maria, que soube cantar de modo único, no Magnificat, as maravilhas que Deus realizou na história do homem. Com estes bons votos, concedo-vos a todos a minha afectuosa Bênção.

Dado em Roma, junto de São Pedro, no dia 22 de Novembro de 2003, memória de Santa Cecília, no vigésimo sexto ano de Pontificado.

Notas
1) Pio X, Pontificis Maximi Acta, vol. I, pág. 77.
2) Ibidem.
3) Ibid., n. 1, pág. 78.
4) Ibidem.
5) N. 12.
6) Ibidem.
7) Ibidem.
8) Cf. AAS 59 (1967), pp. 312-316.
9) Cf., por exemplo, Discurso ao Pontifício Instituto de Música Sacra no 90 aniversário de fundação (19 de Janeiro de 2001), 1:  Insegnamenti XXIV/1 (2001), pág. 194.
10) Audiência geral de 26 de Fevereiro de 2003, 3:  L'Osservatore Romano (ed. port. de 1.3.2003), pág. 124.
11) Concílio Ecuménico Vaticano II, Const. sobre a Liturgia Sacrosanctum concilium, 112.
12) Discurso aos participantes da assembleia geral da Associação Italiana Santa Cecília (18 de Setembro de 1968), em:  Insegnamenti VI (1968), pág. 479.
13) Ibidem.
14) N. 50, em:  AAS (2003), pág. 467.
15) N. 2, pág. 78.
16) Ibid., pp. 78-79.
17) Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum concilium, 116.
18) Cf. S. Congregação para os Ritos, Instrução sobre a música na sagrada Liturgia Musicam sacram (5 de Março de 1967), 50, em:  AAS 59 (1967), 314.
19) Motu proprio Tra le sollecitudini, n. 3, pág. 79.
20) Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum concilium, 116.
21) Cf. Ibid., n. 30.
22) Ibid., n. 114.
23) N. 19, em:  AAS 59 (1967), 306.
24) Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, 115.
25) Cf. Motu proprio Tra le sollecitudini, n. 28, pág. 86.
26) Cf. Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, 115.
27) Pio X, Motu proprio Tra le sollecitudini, n. 2, pág. 79
28) Cf. n. 119.
29) N. 49, em:  AAS 95 (2003), pág. 466.
30) N. 118.
31) Ibidem.
32) João Paulo II, Discurso no Congresso Internacional de Música Sacra (27 de Janeiro de 2001), 4, em:  Insegnamenti XXIV/1 (2001), pp. 239-240.
33) Motu proprio Tra le sollecitudini, n. 3, pág. 79.
34) Cf. Concílio Ecuménico Vaticano II, Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium, 112.
35) N. 12, em:  Insegnamenti XXII/1 (1999), pág. 718.
36) Concílio Ecuménico Vaticano II, Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum Concilium,112.
37) Motu proprio Tra le sollecitudini, n. 24, pág. 85.
38) Cf. João Paulo II, Carta ap. Vicesimus quintus annus (4 de Dezembro de 1987), 20:  AAS81 (1989), pág. 916.
39) Cf. João Paulo II, Const. ap. Pastor Bonus (28 de Junho de 1988), 65, em:  AAS 80 (1988), pág. 877.
40) Cf. João Paulo II, Carta enc. Dies Domini (31 de Maio de 1998), 50, em:  AAS 90 (1998), pág. 745; Congregação para o Culto Divino e a Disciplina dos Sacramentos, Instr. Liturgiam authenticam (28 de Março de 2001), 108, em:  AAS (2001), pág. 719.
41) Institutio generalis Missalis Romani, editio typica III, pág. 393.
42) Motu proprio Tra le sollecitudini, nn. 15-18, pág. 84.
43) Concílio Ecuménico Vaticano II, Const. sobre a sagrada Liturgia Sacrosanctum concilium,120.
44) Ibid., n. 112.

Por favor comentai dando a vossa opinião ou identificando elos corrompidos.
Podeis escrever para:

capelagregorianaincarnationis@gmail.com

Print Desejo imprimir este artigo ou descarregar em formato PDF Adobe Reader

Esta ferramenta não lida bem com incrustrações do Sribd, Youtube, ou outras externas ao blog. Em alternativa podeis seleccionar o texto que quiserdes, e ordenar ao vosso navegador que imprima somente esse trecho.

PROCURAI NO BLOG